Transeunte ingénuo no Intendente.
"O melhor afinador de acordeões mora perto do Largo do Intendente. Chama-se João Pedro, já tem 80 anos mas continua com mãos de ouro para tudo o que é acordeão.
Vive com a esposa num modesto prédio na Travessa do Maldonado; o prédio está em obras há anos, com montes de areia e sacos de cimento na entrada. "Mas isso não é o pior", diz a esposa Dona Aurora, "o pior é o bairro, é um bairro de prostitutas".
Ontem fui ter com o Sr. João por causa de uma avaria no meu acordeão. Preciso dele para a animação permanente na EXPO '98, por isso o caso era urgente e o Sr. João resolveu-me o problema no mesmo dia.
E assim passei duas vezes num só dia pelo bairro do Intendente, ao levar e ir buscar o instrumento. Às onze de manhã, tudo calmo: uma prostituta espreguiçava-se à porta, outras conversavam em grupo, nada de actividade profissional a essa hora. Quando voltei às sete da tarde, o cenário era outro: de cinco em cinco metros um par de pernas a mostra.
Como estrangeiro indisfarçável, louro ainda por cima, eu já previa uma passagem mais complicada nesse ambiente de linhas curvas, assobios aliciantes e sussurros de palavras doces. A passagem tornou-se mesmo difícil quando um homem, mal vestido e com pele de réptil, me abordou sem rodeios: "Então, vamos para baixo ou não?"
Era um chulo, mas tinha a técnica dos arrumadores de carros: um arrumador de prostitutas, ou melhor, de clientes de prostitutas. Os carros são os clientes, o lugar de estacionamento é a cama da prostituta. Mas neste caso o homem teve azar. Eu não tinha trocos."
(publicado no dia 12 de Julho 1998)
3 comentários:
Aí está. Se fosses acompanhado por uma criancinha o chulo não se teria metido contigo.
Fizeste-me lembrar uma história burlesca q ouvi recentemente. Perto do Liceu Maria Amália também há actividades desse cariz. Ora, há algum tempo atrás, uma professora incauta que se tinha inocentemente dirigido ao multibanco para levantar dinheiro, é abordada por um homem que lhe pergunta: "quanto é que levas". A pobre, varada de medo, responde a quantia q tinha levantado: "60 euros", ao que o senhor replica "levas caro, tu!!". Não sei se ela sentiu mais alivio por não estar a ser assaltada, ou mais vegonha por ser confundida com uma prostituta...
Quanto a mim, todos os dias me deparo com o fenómeno da prostituição de beira de estrada, na afamada recta de Coina - e posso dizer que não me é nem um pouco agradável!
abraço
Cara Betty,
A história é boa, mas acredito que a professora não ganhou para o susto.
Sobre o fenómeno da prostituição as opiniões dividem-se. Mas quando conduz a situações de falta de dignidade humana ou crime, é uma tristeza.
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