23/02/2012

José Gil sobre o Acordo Ortográfico


Parece que, a pouco e pouco, o Acordo Ortográfico vai perdendo terreno. Todos os argumentos que o criticam foram já repetidamente enunciados: desde a importância da etimologia ser irreconhecível nas palavras desfiguradas, ao facto, intolerável, de se impedir assim o livre desenvolvimento e transformação do português. Este é, sem dúvida, um dos aspectos mais graves desse Acordo imposto artificialmente a todo um mundo de falantes da língua portuguesa.

Uma língua é um organismo vivo e, segundo o seu contexto social, geográfico, histórico, demográfico, económico, geopolítico, transforma-se imprevisivelmente. É a multiplicidade livre dos movimentos que fazem evoluir naturalmente uma língua que permite o surgimento de casos extremos, geniais, que subvertem a língua ao ponto de inventarem novas sintaxes dentro da sintaxe habitual: esses casos, revolucionários, como o de Guimarães Rosa ou de Pessoa, só são possíveis quando o espaço virtual de liberdade interna da língua se solta e ousa, para além do uso rotineiro e correcto da gramática.
Então nascem novas gramáticas (como a do Livro do Desassossego ou a do Grande Sertão: Veredas), novas palavras e expressões, os horizontes da língua abrem-se indefinidamente (até onde Pessoa poderia ter ido para além de onde foi? Ninguém duvida que poderia ter ido mais longe ainda, mas ninguém sabe para onde e até onde teria ido). Então descobre-se a maravilha de ser possível uma outra expressão linguística, um insuspeitável sentido das coisas, um outro pensamento. E uma outra expressão é uma dimensão até ali escondida, por dizer e para ser dita, da liberdade. Porque impede (ou entrava) tudo isto, o AO é repressivo e destruidor.

MAS NÃO SÃO Só AS POSSIBILIDADES dos casos extremos que são afectadas. Porque todos nós vivemos nesse meio natural das distâncias soltas e invisíveis que a língua cria a cada instante: no calão (língua do corpo), no humor, no jogo certeiro de um argumento, na invenção, por uma criança, de um palavrão. Vivemos mergulhados na liberdade da língua, para a qual permanentemente contribuímos. É que nós dizemos mesmo o que não sabemos que dizemos. Através do inconsciente da língua, o sentido físico, arcaico, dos fonemas, as sensações ligadas às letras, a doçura e a aspereza do ar inspirado e expirado no som inarticulado ou palreado pelo bebé são retomados sem o saber pelo adulto na palavra articulada. A ortografia é afectiva, polissémica, racional e fugidia, conectiva e disjuntivas (aliterações, ressonâncias, ritmos, cromatismos, etc), indutora de associações com novas palavras e construindo non-sens. Induz um espaço indefinido de criação. Como eu amava «auto-retrato» e me sinto esmagado pelo «autorretrato»! Porque contraria este movimento natural da escrita, o AO é néscio e grosseiro.

UM ÚLTIMO EFEITO, talvez o mais grave: o Acordo mutila o pensamento. A simplificação das palavras, a redução à pura fonética, o «acto» que se torna «ato», tornam simplesmente a língua num veículo transparente de comunicação. Todo o mistério essencial da escrita que lhe vem da opacidade da ortografia, do seu esoterismo, desaparece agora. O fim das consoantes mudas, as mudanças nos hífenes, a eliminação dos acentos, etc, transformam o português numa língua prática, utilitária, manipulável como um utensílio. Com se expusesse todo a seu sentido à superfície da escrita. O AO afecta não só a forma da língua portuguesa, mas o nosso pensamento: com ele seremos levados, imperceptivelmente, a pensar de outro modo, mesmo se, aparentemente, a semântica permanece intacta. É que, além de ser afectiva, a ortografia marca um espaço virtual de pensamento. Com o AO teremos, desse espaço, limites e contornos mais visíveis que serão muros de uma prisão onde os movimentos possíveis da língua empobrecerão. Como numa suave lavagem de cérebro.

(Agradecimento à revista Visão de 16/02/2012)

Foi há 25 anos - Zeca sempre


Faz hoje 25 anos que morreu Zeca Afonso.

Há tributos em vários lugares, em Lisboa na Academia de Santo Amaro em Alcântara:
http://diariodigital.sapo.pt/news.asp?id_news=559918

Há 5 anos houve, muito a propósito, dois posts em simultâneo neste blogue:
- http://anacruses.blogspot.com/2007/02/zeca-afonso_23.html

Dies irae - Theatrum - Rodrigo Leão & Vox Ensemble (1996)


O meu apelido sempre foi um problema neste país ("Rini Luyki"!? - clicar para ampliar), mas gostei de colaborar neste álbum.

06/02/2012

François Truffaut nasceu há 80 anos

Não costumo ir atrás das efeméridas sugeridas pelo Google, mas no caso do cineasta François Truffaut (1932 - 1984) existe justificação.
Eu não fazia ideia que a sua vida demasiado curta tinha sido tão dramática e impetuosa, excelente retrato na Wikipedia: http://pt.wikipedia.org/wiki/Fran%C3%A7ois_Truffaut

Aqui o trailer de uma das suas obras primas: "Jules et Jim" (1962)

04/02/2012

Glenn Gould - 32 Variations in C minor - Beethoven



Um bom exercício para o ouvido...hoje logo de manhã na Antena 2.

02/02/2012

Libertação



Finalmente!

01/02/2012

Mísia - "Senhora da Noite" - 4 de Fevereiro no Teatro São Luiz!


"Senhora da Noite" representa um claro retorno de Mísia - 10 anos depois de Ritual (2001) - ao fado tradicional, o terreno emocional mais íntimo da cantora. Pela primeira vez na gravação de um disco de fado, poesia escrita exclusivamente por mãos femininas: por escritoras e poetisas, como Agustina Bessa-Luís, Hélia Correia, Lídia Jorge, Florbela Espanca, Natália Correia, Manuela de Freitas, Maria do Rosário Pedreira, Rosa Lobato de Faria; por cantoras e fadistas, como é o caso de Amália Rodrigues, Amélia Muge, Adriana Calcanhotto e Aldina Duarte ou a própria Mísia. Um trabalho onde se evidencia o estatuto criativo da Mulher. Reencontramos aqui a sonoridade de Mísia constituída pela base tradicional do fado (guitarra portuguesa, viola de fado e baixo acústico) e a cumplicidade musical do acordeão, violino e piano. Este é também um trabalho que assinala 20 anos de carreira discográfica da cantora.

e ainda...

AS AUTORAS DE SENHORA DA NOITE
3 FEV
SEXTA ÀS 19H00
JARDIM DE INVERNO
ENTRADA LIVRE

Lídia Jorge, Amélia Muge e Teresa Villaverde à conversa com Mísia, num encontro moderado por Nuno Pacheco, onde se falará sobre o estatuto criativo da Mulher no fado e não só, para além do seu papel habitual de médium/intérprete. Também se abordará a experiência de escrever para este género musical, sendo esta uma estreia para algumas das convidadas.





P.S. Sou fã dela, claro está...

Reformas na Suíça com tecto máximo de 1700 euros

Reformas na Suíça com tecto máximo de 1700 euros - Mundo - Notícias - RTP

Suiça, um país bem mais quente do que Portugal...